12/05/2012

Literatura para Jovens

Eu não sei o que é literatura para jovens.
Se houvesse fórmula, eu vendi-a e estava rica.
Até quando se é jovem e quando é que se deixa de o ser?
A fronteira é demasiado fluída para se estabelecerem regras.

Por isso às vezes até tenho vontade de ir para um desses milhentos cursos de Escrita Criativa para Jovens para ver se, finalmente, sei o que ando a fazer. Eu escrevo literatura. Ponto. Se os mais jovens me lerem, ótimo. Se não lerem, temos pena.

Mas não escrevo nada propositadamente para eles, ou seja, a pensar na idade que provavelmente terão. (Um dos maiores elogios que recebi foi de uma leitora que tinha lido “Chocolate à Chuva” em adolescente e depois em adulta: “parecia um livro diferente; acho que é um livro que cresceu ao mesmo tempo que eu.”)

Nem escrevo nada “subordinada a mote”. Não escrevo ”romances sobre a droga” nem sobre qualquer outra coisa. A realidade onde vou buscar os meus temas se encarrega de me dar os motes suficientes.

Há algum tempo, a revista Visão incluiu uma série de livros de autores portugueses, sendo que teria de ser um livro de poesia e outro de prosa. No meu livro, para a parte de prosa foi escolhido o romance “Às Dez a Porta Fecha”, habitualmente considerado para jovens mas ali sem nenhum rótulo. E foram muitos os que, depois de o lerem, me disseram “ não sabia que também escrevias romances para adultos!”

Talvez por isso seja o que eu escrevo mais e onde me sinto melhor: profundamente egoísta − assumo − não penso em ninguém senão em mim enquanto escrevo. Se está como eu gosto, se é aquilo que eu quero, se não serei capaz de fazer melhor (e se esta dúvida me assalta, deito tudo fora e começo tudo de novo.)

Quando escrevi o meu último romance − “Os Profetas” − o editor perguntou-me : “é para jovens ou para adultos?” E eu respondi: “lê e resolve tu.” Ele achou que era para adultos. Tudo bem.

Claro que isto não tem nada a ver com a escrita para crianças − e aí tudo é completamente diferente.

Mas disso outros falarão melhor do que eu.

Alice Vieira
(Escritora)

1 comentário:

  1. Cara Alice Vieira,

    Concordo com "quase" tudo o que diz, E o "quase" tem a ver com a sua afirmação final “Mas disso outros falarão melhor do que eu”. Poderia aceitar se dissesse que outros reúnem também as condições necessárias para falar, com conhecimento de causa, sobre «Literatura para Jovens». Mas melhor? Para aceitar essa sua modéstia, eu precisaria de ter uma memória muito curta. Mas há coisas que merecem não ser esquecidas e que os arquivos permitem recordar melhor quando é oportuno.
    A Alice Vieira alia à capacidade de saber com poucos falar sobre literatura para crianças, ao saber, de experiência feito, de aconselhar a leitura mais apropriada e motivar o público juvenil para a leitura. Aqui fica parte do texto que escreveu, no Outono de 1990, sobre a secção «Clube da Gente Nova» que a partir dessa data, e durante longo tempo, passou a integrar a revista do Círculo de Leitores contando com a sua colaboração:

    “Olá!
    A partir de agora, vamos encontrar-nos todos os trimestres, aqui, neste espaço que vos é especialmente destinado, e onde se fala das novidades que o Círculo de Leitores tem pra vos dar.
    Claro que seria muito melhor podermos estar aqui uns com os outros, a mexer nos livros, a folheá-los, a sentir o cheiro do papel e da tinta, a trocarmos impressões, etc…

    Como vêem há para todos os gostos. Tenho a certeza que, apesar da televisão, ou do jogo de vídeo, ou dos trabalhos de casa que o professor marcou, todos vocês vão encontrar um bocadinho de tempo livre para sentirem esse prazer enorme e diferente que só a leitura é capaz de dar.
    Se fizer sol peguem no livro e leiam-no à sombra de uma árvore, diante do mar, sentados na areia ou numa esplanada. Se estiver frio ou chuva leiam-no num cantinho do vosso quarto, comendo torradas, bebendo chocolate quente ou trincando uma maçã. Verão como a leitura terá outro sabor…
    Se quiserem responder a esta carta, cá estou às ordens!
    Até Novembro!
    Alice Vieira”

    Um abraço muito cordial,
    Rui Beja

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